Por Adriana Guimarães e Vanessa Bacilieri

O Conselho Federal de Medicina (CFM) trouxe a lume com a Resolução nº2336/2023, prevista para vigorar a partir de março de 2024, uma série de disposições que visam contemporizar a prática médica em consonância com as novas dinâmicas comunicacionais, preservando, contudo, o cerne ético que sustenta a profissão. A viagem por suas nuances despertar e flexões interessantes e projeta uma série de expectativas no horizonte médico nacional.

Em um panorama onde as transformações tecnológicas e comunicacionais são ímpetos que reverberam em diversas profissões, a possibilidade agora concedida aos médicos de divulgarem os “antes e depois” de procedimentos é um ponto de alta relevância. Embora esta seja uma prática já familiar a outros profissionais da saúde, como os dentistas, ela emergiu com contornos específicos na medicina. Não é uma liberalidade desmedida, pois é imperativo que haja uma autorização explícita para a utilização da imagem, o asseguramento do anonimato, e o respeito intransigente ao pudor e à privacidade do paciente.

Além disso, a oportunidade agora aberta para que aparelhos homologados pela Anvisa e pelo próprio CFM sejam publicizados, garante uma janela para que o paciente esteja informado sobre tecnologias empregadas em seus tratamentos, uma transparência que pode nutrir a relação médico-paciente com mais confiança e segurança.

No entanto, a novidade que permite aos médicos divulgar em suas pós-graduações, ainda que tenham que ostentar o termo “NÃO ESPECIALISTA” em letras garrafais, fomenta um debate relevante. A pergunta que surge é: quais profissionais optarão por destacar suas formações continuadas sob a sombra de uma ressalva tão impactante visualmente?

O esboço regulatório da Resolução nº 2336/2023 não se esquiva também de entrar nas águas delicadas das questões promocionais e financeiras, trazendo dispositivos que versam sobre promoções, divulgando valores e proibindo práticas como a “venda casada” e premiações. Aqui, o conflito ético se agiganta, pois o Código de Ética Médica preconiza, de forma veemente, contra a mercantilização da medicina.

Nesse interlúdio, é vital recordar que a nova Resolução não pode ser digeridade forma isolada. A teia legislativa que gere a relação médico-paciente é rica e diversificada,  com marcos como o Código de Defesa do Consumidor e a própria Constituição Federal, oferecendo proteção e direitos que podem ser invocados em distintas situações, sublinhando assim a multifacetada natureza da prática médica contemporânea.

A futura publicação do manual da CODAME está envolta em uma atmosfera de expectativa e, sem dúvida, carrega a missão de elucidar os pontos nebulosos e criar um caminho claro e seguro sob a égide da Resolução CFM nº 2336/2023. A finalidade deverá ser orientar de forma precisa os médicos, de modo que a evolução na comunicação e publicidade não descaracterize os princípios éticos que devem nortear a medicina.

Assim, a Resolução CFM nº 2336/2023, com seus avanços, suas polêmicas e suas inevitáveis tensões, dialoga com os desafios que a medicina contemporânea precisa enfrentar, permitindo-se modernizar, mas sem jamais desconsiderar a ética e o comprometimento vital com o paciente. Nesse contexto, a CODAME precisa ser a bússola que orientará a prática médica nesta nova realidade, construindo um futuro onde a ética e a modernização caminham lado a lado.

Adriana Guimarães é advogada inscrita na OAB/BA sob o nº 25041, pós-graduada em Direito Médico e da Saúde e professora de Direito Médico

Vanessa Bacilieri é servidora pública, Mestra em Direito Privado e Econômico pela UFBA, especialista em Direito Médico e também professora de Direito Médico