*Fonte: Site G1 Bahia

A doméstica Madalena Santiago da Silva viveu 50 dos seus 60 anos sem receber salários, maltratada e roubada pela família para quem trabalhava em Lauro de Freitas, na Região Metropolitana de Salvador. Agora, após ser resgatada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), tenta recomeçar a vida.

Madalena da Silva conta que, durante o período que esteve em situação análoga à escravidão, a filha dos patrões fez empréstimos no nome dela e ficou com R$ 20 mil da aposentadoria da doméstica. “Eu estava sentada na sala, ela passou assim com uma bacia com água e disse que ia jogar na minha cara. Aí eu disse: ‘Você pode jogar, mas não vai ficar por isso. Aí ela disse: ‘Sua negra desgraçada, vai embora agora’, disse Madalena.

 

Atualmente, Madalena da Silva recebe seguro desemprego e um salário mínimo da ação cautelar do MPT. A situação de Madalena é semelhante a de Leda Lúcia dos Santos, que tem 62 anos e tenta se livrar dos péssimos momentos que passou, desde os 9 anos, onde trabalhava como doméstica, sem receber salário. A idosa afirma que vivia sob ameaças e era proibida de sair da casa onde morava, no bairro de Patamares, em Salvador.

Agora, Leda Lúcia passa o tempo com as bonecas feitas de pano, que viraram suas melhores amigas. A idosa afirma que tentou fugir diversas vezes, mas a ex-patroa dela a ameaçava com punições. Resgatada há um ano, Leda, que conta que não sabia do direito que tinha, de ganhar dinheiro pelos serviços prestados, passou a receber um salário mínimo e vive em um abrigo municipal parceiro do MPT. “As vezes eu fugia de casa porque ela queria me bater, aí assim eu fugia de casa. Ela fazia grosseria comigo, me gritava”, contou. A idosa afirmou que a principal mudança na vida dela foi a sensação de alegria ao viver em liberdade.

Vera Lúcia também foi vítima de maus tratos.

Quinze piaçaveiros e um vaqueiro estavam embrenhados em uma região de mata no município de Santa Luzia, no sul do estado. O grupo vivia em cabanas improvisadas, sem banheiro e bebia a mesma água dos animais. Os 16 trabalhadores que se arriscavam na produção da fibra de piaçava, usada em vassouras, também não tinham carteira assinada e foram resgatados por fiscais do Ministério Público do Trabalho.

Depois da ação, que aconteceu no dia 18 de abril, os piaçaveiros e o vaqueiro receberam R$ 55 mil pelas verbas da rescisão. “Uma vez resgatado esse trabalhador e havendo a necessidade dos desdobramentos, o Ministério Público Federal, ramo que tem atribuições e competências para dar os encaminhamentos necessários, pode fazer uma denúncia no setor Judiciário. A partir dali pode ser pedida a prisão do executor dessas medidas cruéis em classe dos trabalhadores”, disse o procurador-chefe do MPT, Luís Carneiro.

Os trabalhadores rurais são os mais submetidos às condições de jornada exaustiva, trabalho forçado. No ano passado, dos 70 trabalhadores resgatados pelo MPT na Bahia, 53 estavam no cultivo da Carnaúba, em Xique-Xique.
Desde que o MPT começou a fazer o levantamento, em 1995, 3.451 trabalhadores foram resgatados no estado. Ao todo foram pagos R$ 6 milhões em rescisão. A cidade de São Desidério, no oeste do estado, foi a que mais registrou casos de trabalho análoga à escravidão na Bahia. O estado é o segundo na lista suja do MPT e perde apenas para Minas Gerais.

Nessa lista, oito empregadores que submeteram 72 trabalhadores a condição análoga à escravidão são baianos. Este ano, pela primeira vez um empregador doméstico entrou para a lista. Um caso de 2017, na cidade de Elísio Medrado. Leda está entre as oito trabalhadoras domésticas resgatadas no ano passado. Este ano foram cinco, sendo quatro delas em Salvador.

Projeto de resgate

Neste primeiro ano do Projeto de Combate à Exploração do Trabalho Doméstico, 550 empregadores foram fiscalizados na Bahia. O MPT informou que 90% das denúncias aconteceram em Salvador.
“O que chamou muito a atenção da gente nas fiscalizações planejadas foi o nicho dos cuidadores. São pessoas que muitas vezes estão ali sozinhas para dar conta de um idoso, por um período imenso de tempo e não tem uma pessoa para substituir o trabalho nesse posto de trabalho”, afirmou auditoria fiscal do trabalho Liane Durão. “Foi uma atividade que a gente percebeu muita irregularidade relacionada a jornada, como falta de registro de jornada e falta de pagamento de horas extras”, disse ainda a auditora.

A pena para quem submete trabalhadores à situação análoga à escravidão é de 2 a 8 anos de reclusão. No entanto, até o momento nenhum empregador “sujo” ficou preso na Bahia. O procurador-chefe do MPT afirma que há esperança que a punição ocorra no mesmo ritmo de crescimento de trabalhadores resgatados. Em 2021, o número cresceu 168% em relação à 2020.