Saudade do que não vivemos

por Domingos Matos
5 comentários 2 minutos para ler

Por Domingos Matos

É como um texto que acontece na cabeça e no coração, mas que jamais publicarei. Estruturado em lembranças e projetos. Aos poucos ganha contornos de um roteiro.

Está aqui, é perfeito, mas não está acabado, a cada dia coloco um período, acrescento um parágrafo, corrijo uma vírgula…

Mas parece que é escrito na areia de uma praia, e sempre no momento em que a maré cheia atinge seu ponto máximo… a onda vem e apaga tudo.

Mas reescrevo.

Em julho, a maré foi forte. Levou todos meus escritos. Lembro que tinha acabado o parágrafo em que a gente se mudava para uma chácara.

Terreno plano, sem obstáculos. De um lado, o viveiro das galinhas. À frente, um pequeno pomar. A casa, de varanda. Viveríamos nós quatro, dois filhos, duas sogras. Mas a onda foi forte.

Mas, a vida segue. É o que dizem.

Dezembro. Tudo reescrito. Do projeto inicial, só restou a casa de varanda. Que fosse plana, sem obstáculos, como a da chácara, mas já sem galinhas e sem pomar. O foco agora era…

Novamente a onda e… tudo apagado!

Velório, alta madrugada, releio o texto que jamais publicarei. Olhos fechados, tudo passa como um filme na cabeça. Um roteiro tão perfeito…

Nesse dia tão triste, um amigo me disse: “a gente só aprendeu a ganhar os presentes de Deus. Não percebemos que somos apenas fiéis depositários, e que um dia teremos que devolvê-los”.

Este ano devolvi minha mãe, em julho, e minha sogra, nesse dezembro inimaginável.

Mas logo é janeiro, e a escrita desse roteiro recomeça, com a descoberta de um novo sentimento: saudade do que não vivemos.

Essa estranha formulação finalmente fez sentido. É a saudade dos sonhos não realizados. Mas como eles aconteceram na cabeça e no coração, serão eternamente reais.

P. S.: Na foto, à esquerda, minha mãe, Dona Carminha; à direita, minha sogra, Dona Rita.

5 comentários

Maria Solange Nascimento Batista 30 de dezembro de 2021 - 08:22

Que texto lindo! Estou emocionada. Deus nos conforte em nossas perdas

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Anônimo 30 de dezembro de 2021 - 22:27

Maravilhoso texto. Agora fica a saudade e as lembranças boas.

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Alice Luz 31 de dezembro de 2021 - 00:20

Que texto lindo, meu querido amigo!Lendo-o vivenciei todos os seus passos e vivi a sua saudade . Não conheci a sua genitora,mas sei da grandeza do deu coração e do amor e carinho seu por ela.Quanto a Rita conheci e vivi bons momentos ao seu lado quando trabalhamos no General Osório.Rita foi mais que a colega foi uma amiga sincera até ontem quando partiu para a casa do Pai.Dela guardarei boas lembranças e a sua amizade sincera.Para seguir essa cumplicidade deixa -me Ritinha,a quem tenho como minha sobrinha querida além de ser “As meninas de Alice”.Que Deus a tenha na sua glória.Meus sentimentos AVC e Ritinha.Saudadrs Alice

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Ricardo ribeiro 31 de dezembro de 2021 - 07:39

Lindo texto, meu amigo! Só sai assim quando é escrito com a alma. Entender os desígnios de Deus não os torna menos dolorosos, mas a vida está sempre a nos exigir essa difícil compreensão. Cuidem-se aí, você e Ritinha, porque a história segue com vocês. Forte abraço, velhinho!

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Angelina Campos 31 de dezembro de 2021 - 08:35

Meus sentimentos a família!

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