A prefeitura de Itabuna, a partir de um pedido da Secretaria de Transporte e Trânsito (Settran), comprou, em 9 de outubro de 2015, 80 abrigos para pontos de parada de ônibus. A compra foi regida pelo contrato 246/2015, que, por sua vez, obedeceu ao Pregão Presencial 060/2015. Há uma investigação a respeito dessa compra. A prefeitura pagou tudo, R$ 450.000,00, mas não teria recebido o que comprou, segundo os corredores próximos ao gabinete do secretário. A informação é que foram entregues apenas 50, dos 80 abrigos contratados.

Numa olhada no Diário Oficial descobre-se que em 21 de outubro de 2015 foi publicado o extrato do tal contrato. A empresa é a Seguraço Indústria e Comércio de Móveis Ltda. O valor, R$ 475.000,00, quase meio milhão de reais. O secretário à época era o geógrafo Roberto José. Já se insinuava, naquele momento, como potencial candidato a prefeito nas eleições desse ano, o que, de fato, só não ocorreu por movimentos políticos alheios à sua vontade. Acabou candidato a vice-prefeito na chapa do ex-prefeito Capitão Azevedo.

O diretor de Transporte e o chefe de Acompanhamento de Gestão eram – e são ainda –, Edmilson da Silva e Antongnone Coelho, o Pastor Tony, respectivamente. Esses, junto com o então secretário, eram os três agentes públicos diretamente ligados à observância da necessidade dos tais abrigos e quem detinha o poder de autorizar a compra e também fiscalizá-la, no âmbito da Settran, fora os órgãos de controle interno da própria Prefeitura.

Procurado pela reportagem, Roberto José disse que os abrigos ainda não haviam sido totalmente entregues quando ele ainda estava na secretaria. “Mais de 80% já havia sido entregue”, afirma (veja “Outro lado”). A curiosidade sobre essa compra no mínimo “desleixada” é que ela foi integralmente paga, mesmo sem ter sido concluído o objeto do contrato. Os comprovantes de pagamento estão no Portal da Transparência do Município, sob os números 018/2016 e 019/2016, efetuados no primeiro dia útil desse 2016: R$ 290.937,50 e R$ 174.562,50 em sequência (clique na imagem para ampliá-la).

Suspeitas? Não se teria como determinar, apenas observando o que se conhece dos fatos.  Embora não se compreenda a pressa em pagar integralmente um contrato de meio milhão de reais no primeiro dia útil do ano, se não havia a comprovação da entrega do seu objeto.

Preço salgado

Quem usa um abrigo dos que foram instalados, dificilmente imagina estar sentado – ou simplesmente abrigado – numa peça tão valiosa. Fazendo as contas, descobre-se que cada abrigo custou módicos R$ 5.937,50 – isso, se calculado sobre o que foi contratado. Se dividir o valor pago (475.000,00) pelo número de abrigos entregues, cada um terá custado R$ 9.500,00.

A reportagem não tem como saber se esse preço é caro ou barato. Então, pediu um orçamento em uma serralheria que apresenta as mesmas condições de produção da Seguraço: em valores de hoje, R$ 120.000,00. Muito mais barato, obviamente. Então, foi dito que era para orçar pensando em uma venda para a prefeitura, o que pode implicar em demora de pagamento – não para a Seguraço, como se viu – e foi admitido que o preço poderia variar para R$ 136.000,00. Preços unitários de 1.500,00 e 1.700,00.

Outro lado

A reportagem procurou a Settran. O atual secretário, Valério Hafner, disse que a compra está em análise na Procuradoria-geral do Município. Por isso, não quis fazer maiores comentários. “Estou aguardando o parecer dos procuradores, por isso não posso fazer comentários nesse momento”.

Já o ex-secretário, Roberto José, afirmou que enquanto esteve à frente da Settran, o contrato seguiu sem irregularidades. “Averiguar e contabilizar é função da Procuradoria. Assim, se a empresa não entregou todo o material contratado, essa empresa deve ser punida na forma da lei”.

Ele também disse, por meio de mensagens no telefone, que até a sua saída a empresa já havia entregado mais de 80% do contrato inicial, mas se houve um aditivo, não foi em sua gestão. “Durante meus 10 meses à frente da Settran, não houve irregularidade alguma nesse contrato”.

(Publicado originalmente no Jornal Agora, edição de 05 a 07.11)