Por José Antonio Loyola Fogueira

Em 2022 será realizada mais uma edição do Censo Demográfico, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É imprescindível para o governo brasileiro, na formulação e implementação de políticas públicas, que se saiba quantos brasileiros somos, onde vivemos, em que situações estamos, financeiramente, nível de educação formal, acesso a saúde, habitação, segurança. São cenários que os gestores levam em conta, baseados em números e estatísticas, para proposição, manutenção ou aperfeiçoamento das políticas publicas.

Esses questionamentos devem ser respondidos pelos brasileiros e suas famílias. E no caso das pessoas LGBTI+(Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexuais,+) e suas famílias? Também estarão representadas no Censo 2022?

Não, não estarão.

E, para evitar este apagamento de uma população especifica LGBTI+, a Aliança Nacional LGBTi+, oficiou o IBGE, em julho de 2020, solicitando informações do por que da ausência de quesitos como Identidade de Gênero e Orientação Sexual. Em Agosto do mesmo ano, o IBGE, na pessoa do diretor de pesquisas, respondeu aos questionamentos da  Aliança Nacional LGBTI+, dizendo: “Cabe também informar que a definição dos temas investigados no Censo Demográfico é conseqüência de ampla consulta a diversos segmentos representativos da sociedade, bem como de discussões internas envolvendo técnicos e analistas da Instituição, nas áreas de Estatística, Economia, Sociologia, Demografia, Educação, Saúde, entre outras. Ademais, no período que antecede a realização dos Censos Demográficos, o IBGE abre processo de consulta pública em seu portal na Internet para que as instituições de pesquisa, pesquisadores, especialistas e usuários em geral encaminhem sugestões e perguntas sobre conteúdo do próximo Censo”.

Essa é uma das partes da resposta do IBGE à Aliança Nacional LGBTI+, e no seu bojo vemos citados temas que tem impacto direto na vida das pessoas LGBTI+ e suas famílias. Em algumas pesquisas realizadas no Brasil aparecem resultados de que a população LGBTI+, representada em percentuais que vão de 1% a 25%, contudo estes números raramente são levados em conta, visto que não estão balizados por um órgão oficial como o IBGE. Sendo assim, se perde mais uma vez a chance de realização de um Raio X acerca destas pessoas na sociedade brasileira.

Tomando como foco uma área social citada diretamente pelo diretor de pesquisa do IBGE – políticas de saúde -, em 2011, com a portaria nº 2.836/2011 do Ministério da Saúde, foi criada a Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (LGBT). Hoje, 11 anos depois de criada essa Política Publica de saúde, em pouquíssimos municípios do Brasil ela foi implantada, efetivada e executada como direito garantido pela Constituição de 1988, em seu artigo 196, que diz: A saúde é direito de todos e dever do Estado […].

Simplificando a resposta do IBGE: questionar a identidade de gênero e orientação sexual das pessoas é algo sensível e delicado. Então é melhor fechar os olhos e fingir que esta população não existe.

Se levados em conta os números de ISTs, HIV e outras mazelas que se abatem sobre alguns segmentos da população LGBTI+, observando as interseccionalidades em alguns membros da população LGBTI+, fatores como identidade de gênero e orientação ou expressão sexual, são determinantes para que entendamos que alguns corpos desta população irão sofrer em intensidades diferentes. Por exemplo, os corpos LGBTI+ negros; em comunidades e favelas. E se esses corpos forem femininos? E se forem deficientes, podemos imaginar o nível de sofrimento destas pessoas? Sim, podemos imaginar, e só imaginar, pois não somos nós nestes corpos e neste lugar de múltiplos sofrimentos.

Ao não tentar saber quem são e onde estão as pessoas LGBTI+, o IBGE deixa de fornecer números que mais se aproximem da realidade desta população no Brasil, e nesta ausência de números, percentuais e estatísticas, ficam os gestores às “cegas”, e esta parcela da sociedade à “míngua”. E o impacto negativo deste apagamento de parte de uma sociedade não se reflete só nas Políticas Publicas de saúde, mas também na educação e na segurança, onde o Brasil é citado como o país que mais mata a população LGBTI+.

Segundo o Prof. Dr. Toni Reis, presidente da Aliança Nacional LGBTI+ “para se fazer Políticas Publicas,  nós precisamos saber quem somos, quantos somos, onde estamos. Isso é fundamental para todo cidadão e cidadã, sejam eles mulheres, negros, negras, LGBTI+, Indígenas, ciganos, pessoas com deficiência (PCD). Infelizmente o IBGE, de forma extremamente discriminatória, não quer contar em quantos existimos. Hoje existem pesquisas que falam que somos 4%, 7%, 10%, e como praticantes até 25%. É muito importante sabermos quantos somos, não importa se for 1%, esses dados são fundamentais para a formulação de políticas publicas”.

Ainda nas palavras de Reis, “Segundo Mahatma Ghandi, uma sociedade deve ser julgada pelo tratamento que dá as suas minorias, e nós LGBTI+, somada às outras minorias somos muitos. Precisamos, sim, saber das orientações sexuais e identidade de gênero dos brasileiros, quem não quiser declarar, não declare permaneça no armário. Só lembrando uma coisa, os armários são lugares escuros, com morfo e frios, e em tempos de COVID 19, os lugares abertos e a luz do sol faz muito bem”.

Jose Antonio Loyola Fogueira é Mestrando do PPGER-UFSB/CJA; Especialista em Saúde Coletiva – UFSB; Pedagogo – UESC.